
Debruçado sobre a crise com os Estados Unidos, o governo Lula tem que resolver, nesta semana, outra questão que também tem grande impacto sobre a vida dos brasileiros e suas pretensões políticas: vence na sexta-feira o prazo para que ele se posicione em relação ao Projeto de Lei 2.159/ 2021, conhecido como PL da Devastação, aprovado na Câmara e à espera de sanção presidencial. A notícia é de que estão sendo costuradas estratégias para vetar trechos do projeto que representam ameaça à questão ambiental, sem que o corte desencadeie novo ponto de tensão com o Congresso. Trata-se de empreitada que demanda tanto manejo político e diplomático quanto o que tem sido adotado na seara internacional.
A bem-vinda ideia de criação de uma norma geral sobre o licenciamento ambiental não saiu como o esperado. O PL que chegou ao chefe do Executivo é recheado de temas polêmicos, dignos do apelido recebido. Há também à mesa relatórios enviados por entidades ambientais depois da criticada aprovação do PL— em sessão com votação virtual de madrugada, na véspera do recesso parlamentar —, com o objetivo de sensibilizar o governo quanto a possíveis desdobramentos da medida.
Um deles, do Observatório do Clima, indica retrocessos graves em 42 dos 66 artigos do projeto de lei. Na avaliação da entidade, uma das principais redes da sociedade civil na agenda ambiental, a legislação ameaça o meio ambiente, a saúde pública, a governança climática e o patrimônio cultural e arqueológico do Brasil. Em nota técnica também enviada ao Planalto, o Ministério Público Federal solicitou o veto de mais de 30 dispositivos do PL, sob o argumento de que, além de comprometer a proteção ambiental, ele viola a Constituição e infringe tratados internacionais ratificados pelo Brasil.
O Ministério do Meio Ambiente e o Palácio do Planalto avançam na discussão de alternativas a trechos polêmicos. É provável, por exemplo, o veto à permissão de criação de regras locais de licenciamento. A legislação prevê que estados e municípios possam dispensar licenças ambientais para obras e atividades econômicas, o que poderia levar a disputas de facilidades para atrair investimentos, além do enfraquecimento do Sistema Nacional de Meio Ambiente. A ministra Marina Silva tem sido enfática na defesa de uma regra nacional de licenciamento e, nesse quesito, parece viável o impedimento de possíveis leilões ambientais entre entes federativos.
Chegar a um consenso para a chamada Licença Ambiental Especial (LAE), porém, é bem mais difícil. Proposta pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre, a LAE prevê que atividades ou empreendimentos considerados estratégicos por um Conselho de Governo tenham um procedimento de licenciamento diferenciado — com uma etapa, em vez de três—, "ainda que utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente causadores de significativa degradação do meio ambiente". Entidades ambientais alertam para o risco de uso político do modelo. Alcolumbre, por sua vez, fala em eficiência em prol do desenvolvimento sustentável do país.
Fato é que, ainda que Lula vete trechos do Projeto de Lei 2.159/ 2021, o país está longe de um direcionamento equilibrado e tecnicamente embasado para a questão ambiental. O prometido amadurecimento não está por vir. Ao contrário, fala-se em um forte movimento de judicialização, danos irreversíveis à flora e à fauna e, no mínimo, um desconforto internacional às vésperas da COP30, em Belém. Nesse cenário, a cautela pregada pelo presidente na negociação do tarifaço de Trump é também conduta de sobrevivência no encaminhamento da legislação ambiental que está por vir.