
A menos de 48 horas do fim do prazo estipulado pelos Estados Unidos para que a Rússia apresente progressos tangíveis rumo a um acordo de cessar-fogo, o presidente Donald Trump fez gestos antagônicos, nesta quarta-feira. O republicano anunciou uma tarifa adicional de 25% à Índia por comprar petróleo russo e deixou claro que pretende impor sanções a parceiros comerciais de Moscou, apesar das negociações. Ao mesmo tempo, demonstrou o desejo de reunir-se com os presidentes Vladimir Putin (Rússia) e Volodymyr Zelensky (Ucrânia), pouco depois de o enviado especial de Washington, Steve Witkoff, ser recebido pelo chefe do Kremlin. "Existe uma alta probabilidade de uma reunião muito em breve", confirmou o presidente americano, ao citar Putin. O jornal The New York Times informou que o encontro tripartite pode ocorrer na próxima semana. A intenção de Trump é conversar, primeiro, com Putin, para depois falar com Zelensky.
Trump comemorou o que qualificou de "reunião muito produtiva" entre Witkoff e Putin sobre os esforços para pôr fim à guerra na Ucrânia. "Fizemos grandes avanços!", escreveu em sua plataforma Truth Social. O provável encontro teria sido debatido durante uma ligação entre Trump e Zelensky. Uma fonte ucraniana de alto escalão revelou que o telefonema contou com a participação do secretário-geral da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), Mark Rutte; do chanceler da Alemanha, Friedrich Merz; do premiê do Reino Unido, Keir Starmer; e do presidente da Finlândia, Alexander Stubb.
Trump anunciou que informou aos aliados europeus sobre os avanços. "Todos concordamos que esta guerra deve chegar ao fim, e vamos trabalhar para alcançar isso nos próximos dias e semanas", afirmou. O secretário de Estado americano, Marco Rubio, adotou a cautela e explicou que "ainda há muito trabalho pela frente" antes da reunião tripartite.
No mesmo tom de Trump, o Kremlin elogiou o encontro de três horas entre Putin e Witkoff. "Aconteceu uma conversa muito útil e construtiva", declarou à imprensa o conselheiro diplomático de Putin, Yuri Ushakov. Ele acrescentou que Moscou "enviou alguns sinais" sobre a Ucrânia. As imagens divulgadas pelo serviço de imprensa do Kremlin mostraram o líder russo e o enviado da Casa Branca sorridentes, cumprimentando-se, em uma sala luxuosa da sede do Executivo.
O ucraniano Olexiy Haran, especialista em política comparada da Universidade de Kyiv-Mohyla, lembrou ao Correio que Trump assinou um decreto ampliando as sanções à Índia por comprar petróleo da Rússia. "Essas medidas serão implementadas em três semanas; portanto, ainda há tempo para o governo indiano evitá-las", disse. "Não sabemos quais os resultados concretos da reunião entre Witkoff e Putin. Witkoff não é diplomata, não sabe muito, nem é eficiente para lidar com Putin ou com o Oriente Médio", acrescentou. O estudioso acredita que Putin está pronto a fazer alguma concessão para evitar sanções, antes de amanhã, quando expira o prazo dado por Trump.
Por sua vez, o cientista político ucraniano Taras Zahorodny — sócio-gerente do Grupo Nacional Anticrise (em Kiev) — aposta que os EUA deverão impor restrições adicionais sobre as exportações de petróleo russo, sejam elas sanções secundárias ou à frota paralela. "Pode haver algumas limitações relacionadas à realização de transações financeiras para a exportação de petróleo russo. Mas a guerra continuará porque a China apoia a Rússia e compra seu petróleo", disse ao Correio. Zahorodny mostra ceticismo, apesar da provável reunião entre Kiev e Moscou. "Putin seguirá lutando. É importante o contexto. Os americanos dizem que foi Putin quem sugeriu um encontro com Trump em algum momento. Trump concordou, caso isso acabasse com a guerra. Trump não se encontrará com Putin, a menos que ele tenha certeza do resultado", advertiu.
Índia
Depois de uma série de acenos do primeiro-ministro Narendra Modi ao líder da Casa Branca, Trump assinou uma ordem executiva que adiciona 25% às tarifas cobradas dos produtos indianos, em resposta à "contínua compra" de petróleo da Rússia. O texto determina a aplicação da tarifa aduaneira a partir de três semanas — a taxa se soma a outra de 25%, que deve entrar em vigor hoje. A nova sanção não valerá para produtos sujeitos a tarifas específicas, como o alumínio e o aço, e sobre semicondutores e fármacos. "Estimo que impor tarifas (...) além das outras medidas tomadas para responder à emergência nacional será mais eficaz para gerenciar essa ameaça", acrescenta Trump no decreto, referindo-se à capacidade da Rússia de financiar o conflito na Ucrânia. O documento firmado pelo republicano qualifica essa possibilidade como "uma ameaça incomum e extraordinária para a segurança nacional e para a política externa dos EUA".
EU ACHO...
"Trump fará algo contra a Rússia. Ele tentará demonstrar que não foi enganado por Moscou. Existe possibilidade de a Rússia fazer concessões em relação a um cessar-fogo parcial, a fim de vitar sanções. Acho que Trump deseja fechar uma trégua, ou mesmo a paz definitiva. Mas, neste momento, não acho que ele queira recuperar a integridade territorial da Ucrânia. Ele ainda não está pronto para apoiar uma ofensiva ucraniana contra a Rússia."
Olexiy Haran, especialista em política comparada da Universidade de Kyiv-Mohyla
"Enquanto Vladimir Putin estiver no poder, enquanto estiver vivo, ele continuará lutando. Para o presidente da Rússia, esta é uma questão fundamental, pois não pode se dar ao luxo de sequer parar na linha de demarcação e suspender o fogo. Isso representaria uma derrota para ele. Derrota significa perda de poder. No contexto russo, significa perda de vida."
Taras Zahorodny, cientista político e sócio-gerente do Grupo Nacional Anticrise (em Kiev)
Saiba Mais