Caminhos de plástico

Asfalto sustentável: pavimentação com plástico já é uma realidade

Aquilo que seria lixo, surge como possibilidade concreta e solução ecológico para dar suporte às rodovias do Brasil

As caixas de passagem são exemplo da utilização do plástico pós-consumo, ao invés do concreto -  (crédito: Divulgação/Fuplastic)
As caixas de passagem são exemplo da utilização do plástico pós-consumo, ao invés do concreto - (crédito: Divulgação/Fuplastic)

Em fase experimental, o uso de plástico pós-consumo na pavimentação de rodovias é tratado como uma alternativa promissora para o setor de transportes no Brasil. Já utilizado em uma escala maior em outros países, esse tipo de asfalto promete mais durabilidade contra atritos e intempéries climáticas a longo prazo, como mostra a segunda reportagem da série do Correio Caminhos de Plástico. Apesar dos benefícios, a viabilidade econômica de novos projetos pode dificultar um avanço mais rápido.

No Departamento de Engenharia de Transportes da Escola de Engenharia de São Carlos, da Universidade de São Paulo (USP), o professor Adalberto Leandro Faxina conduz pesquisas no campo do uso de materiais reciclados para a fabricação de asfalto. Em parceria com a Agência Nacional de Transporte Terrestre (ANTT), os estudos conduzidos dentro do ambiente acadêmico contribuíram para os primeiros experimentos em campo do asfalto misturado com plástico no país.

Os recursos para a pesquisa provêm de parcelas das receitas de pedágio das próprias concessionárias. Nos casos aplicados em São Paulo, o incentivo financeiro para os experimentos vieram da Eixo SP, responsável pela concessão das rodovias SP-294 e SP-310. O professor da USP avalia que o incentivo a pesquisas sobre o assunto no país pode ajudar a acelerar o processo de implementação dessa tecnologia em escala nacional, assim como foi no caso da borracha no início dos anos 2000, que atualmente já está presente em milhares de quilômetros de rodovias pavimentadas no país.

"Há 20 anos ninguém usava a borracha de pneu, porque não conhecia bem. Depois, passou-se a conhecer bem, a usar, e a ver que realmente funciona. Se a experiência com o plástico for igual à do pneu, a gente deve ter um mercado muito promissor pela frente", avalia o especialista.

O professor acredita que o uso do material pós-consumo é o futuro do setor de infraestrutura rodoviária, considerando os aspectos de sustentabilidade e durabilidade do material. "Quando você pensa em uma rodovia que emprega 2% de plástico em relação ao peso do asfalto que está sendo utilizado, apesar de parecer pouco, isso, ao longo de muitos quilômetros, resulta em um volume muito grande de material que é possível aplicar", acrescenta Faxina.

Impacto ambiental

Somado aos benefícios para o pavimento, a tecnologia também gera ganhos para o meio ambiente a longo prazo. Além de reduzir as emissões de carbono em relação ao asfalto tradicional, a técnica de incluir plástico reciclado na pavimentação também contribui para a redução do descarte inapropriado desse material na natureza. Desta forma, especialistas em sustentabilidade e meio ambiente consideram a inovação como uma oportunidade para uma destinação melhor dos diferentes tipos de plástico.

Na avaliação de André Pereira de Morais Garcia, advogado do Duarte Garcia, Serra Netto e Terra, e especialista em ESG (Ambiental, Social e Governança, na sigla em inglês), o Brasil pode se inspirar em países da Europa que já utilizam o plástico em uma escala maior para a fabricação de asfalto. Na Espanha, por exemplo, já há 16 km de rodovia que utilizam o material reciclado em sua composição.

"O asfalto feito de plástico torna a estrada mais agradável do ponto de vista de ruído do atrito do pneu. Além desses benefícios, você também dá uma destinação sob o ponto de vista de logística reversa, onde o Brasil já tem metas ambiciosas, apesar da gente, muitas vezes, patinar por conta de fatores de infraestrutura e reciclagem, nessa técnica não se faz necessário produzir plástico ou produzir asfalto de outra matéria para pavimentar as rodovias", ressalta Garcia.

O professor titular do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP), Paulo Artaxo, é mais cauteloso a respeito da iniciativa. "Todas as tentativas feitas até o momento de aumentar a reciclagem de plásticos fracassaram totalmente", avalia o pesquisador, que ainda lembra que a fração da quantidade de plástico que é reciclado globalmente ainda é muito pequena.

Viabilidade econômica

O uso de plástico pós-consumo na pavimentação de rodovias é apontado pelos especialistas como uma solução tecnicamente viável, com benefícios ambientais e sociais relevantes. No entanto, o avanço dessa prática ainda esbarra em desafios relacionados ao custo, à escala de produção e ao incentivo para estruturar a cadeia de fornecimento.

Para Robinson Ávila, diretor de Engenharia da Eixo SP, a principal barreira está em garantir um fornecimento constante e competitivo do polímero reciclado. "Hoje o desafio é conseguir ter esse polímero pós-consumo a um preço competitivo ou pouco acima do polímero novo, mas com benefícios ambientais e sociais que compensam. Falta uma escala relevante de empresas capazes de fazer a seleção, limpeza e processamento em larga escala para atender a demanda", afirma. Ele acredita que, com mais fornecedores vendo no setor de asfaltos uma oportunidade, o custo pode se tornar competitivo, aumentando o uso nas rodovias do país.

 


postado em 09/08/2025 03:45
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